05/02/2008

O Hipócrita


Remoendo o seu torpor
o hipócrita tatua cinismo na sua respiração
A mentira partilha a sua alcova
como um manto agradável de agrado aos transeuntes
aos quais mendiga atenção
O hipócrita não gere provocações
antes partilha-as
convenientemente
pelos seus interlocutores opostos
O hipócrita é um feio Haiku
centro vazio de nenhum nada
expectante do cântaro
que irá encher seu vasilhame furado
O hipócrita não é filho
e pai é
por acto falhado
trilha esse trajecto
com o receio que descubram
que é mamífero sem ter sido amamentado
A desculpa da sua condição
é pessoal e reconfortante
justifica-o
e é o passo atrás de passo
filmado pela audiência embasbacada
O hipócrita é na realidade um medroso
um fiel desalinhado das convicções
preso no amor incerto de si próprio
forçado a trair-se
enquanto criança
para não desiludir o espelho refractário
daquele que é na infância futura
Oh que lástima
o carinho que demonstra
num teatro tão realista
que ele próprio é iludido
se é ficção ou intimidade
O hipócrita não nasceu
cresceu na ignorância de si mesmo
e
quando se apercebeu
já era uma refeição